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Quando inovar é empacotar
Especialistas dão cada vez mais atenção à inovação que nasce de uma mudança nos modelos de negócios
Nos últimos anos, os estudiosos se debruçaram sobre a inovação em produtos e serviços (iPod e Amazon são exemplos claros) e sobre a inovação na ponta do consumo (fidelização de clientes e inclusão da base da pirâmide no mercado). Agora eles estão se focando na inovação que surge a partir dos modelos de negócios. O tema ganhou recentemente espaço na mídia por causa da briga de titãs Apple x Google: uma empresa está copiando da outra os respectivos – e consagrados – modelos de negócios. Com a compra da Quattro Wireless, a Apple entrou no campo da publicidade online, enquanto o Google, com o lançamento do celular Nexus One, tenta abiscoitar clientes do iPhone. Uma pesquisa da IBM indica que 50% dos executivos apostam na inovação no modelo de negócios como principal fonte de sucesso das empresas no período de 2010-2020, à frente da inovação em serviços e produtos.
Nessa onda, uma série de trabalhos novos está tratando do tema, como o livro recém-lançado Seizing the White Space (“Ocupando o espaço branco”, em tradução literal), de Mark Johnson, cofundador da Innosight, e o trabalho acadêmico publicado pelo Insead do professor português José Santos intitulado Toward a Theory of Business Model Innovation (algo como “Em direção a uma teoria de inovação em modelos de negócios”).
O modelo de negócios inovador, segundo Johnson, traz uma vantagem competitiva imediata à empresa e abre as torneiras de demandas represadas. Normalmente, diz ele, existem quatro barreiras ao consumo: falta de dinheiro, falta de acesso, falta de capacitação e falta de tempo. Na sua opinião, é pelo modelo de negócios que se superam esses obstáculos. Exemplos? A MinuteClinic, uma rede de atendimento médico de Minneapolis (Estados Unidos), resolveu a barreira do tempo: enfermeiros são treinados para tratar de casos simples, como febre, asma e dor de garganta. As consultas duram em média 15 minutos, e não é necessário marcar hora para ser atendido. A barreira da capacitação foi rompida pela fabricante de softwares de contabilidade Intuit: ela entendeu que seu negócio não era apenas a venda de softwares, mas ajudar os clientes a gerirem melhor suas companhias. Seu foco deixou de ser simplesmente o desenvolvimento de programas. Ela criou a Intuit Community, uma comunidade de especialistas e usuários para resolver dúvidas e problemas.
Um mesmo modelo de negócio pode ser usado em diferentes setores da economia. Foi o que aconteceu com o IPod
Muitos modelos de negócios inovadores, lembra Johnson, nascem da cópia de modelos de outros setores da economia. A Netflix, que causou uma disrupção no mercado de DVDs nos Estados Unidos, o fez imitando as assinaturas de revistas. A Apple, com o iPod e o site iTunes, imitou o “modelo Gillette”, mas ao contrário: dá a “lâmina” (músicas no iTunes) praticamente de graça, o que é compensado com a margem no “barbeador” (o iPod). A Hilti, fabricante de equipamentos para a construção civil (como furadeiras, esmerilhadores e chumbadores) adotou globalmente um bem-sucedido plano de leasing de equipamentos, parecido com o da Xerox, de copiadoras e impressoras para empresas.
O novo modelo de negócios deve ser bem pensado, é claro: ele é como uma grande reforma na casa e mexe na estrutura de receita, na fórmula de lucro e nos recursos e processos da empresa. Porém, de acordo com o autor de Seizing the White Space, uma reforma de modelo começa por uma pergunta muito simples: qual o problema do consumidor que a empresa precisa resolver? É o “trabalho a ser feito”. Como dizia o lendário Theodore Levitt, professor da Harvard Business School, os consumidores não querem uma furadeira. Querem um buraco na parede. Segundo Johnson, essa é a chave para avaliar a pertinência do atual modelo de uma companhia e verificar se ele precisa de mudanças profundas ou não.
Muitas vezes, o desenho vigente é perfeitamente adequado. Algumas empresas, porém, estão se dando conta de que os modelos herdados do século 20 dão sinais de fadiga. A Daimler, como lembra o estudo do Insead, não se define mais como uma fabricante de automóveis, mas, sim, como uma solucionadora de mobilidade. A nova visão amplia potencialmente as frentes de negócios da empresa, que passou a contar, desde o fim de 2008, com o projeto car2go: o aluguel de veículos minúsculos de dois passageiros, cobrando centavos por minuto de uso. Em fase de teste em Ulm, na Alemanha, e em Austin, nos Estados Unidos, o car2go apela para a praticidade. O cliente pode apanhar ou largar o carrinho em qualquer lugar do perímetro urbano. Para Johnson, o ponto central é simples. “Negócios que realmente mudam o jogo não dizem respeito a novas tecnologias. O sucesso nasce de empacotar a tecnologia num modelo de negócios poderoso e apropriado.”